quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

O Afastar das Nuvens



Um dos nossos maiores desafios na vida envolve o entender a desilusão. Porque nos desiludimos? O que aprendemos com isto? Como passar por esse processo sem tanto sofrimento?

À medida que crescemos, vamos arquivando nas nossas memórias, interpretações que fazemos da realidade, dos acontecimentos na nossa vida, vamos criando e absorvendo crenças, ideias do mundo à nossa volta. Trata-se de um arquivo de segurança, para não voltar a repetir o mesmo caminho quando a experiência não foi agradável, e para repetir as experiências que nos fizeram sentir bem. Em muitos destes arquivos, guardamos conceitos, noções, crenças da realidade que adquirimos com as nossas vivências e com o que absorvemos dos outros à nossa volta. Só que, por vezes, alguns desses conceitos, crenças, colidem com a nossa verdadeira natureza, nos limitam. Impedem-nos de vibrar na nossa energia mais pura. São como nuvens que absorvemos e que nos cobrem, escondendo o nosso verdadeiro Eu. Criam ilusões e impedem-nos de ver com clareza os outros e as situações.

Imaginemos que adquirimos uma crença de que um bom amigo é aquele que está sempre presente na nossa vida, qualquer que seja a situação. Quando isto não acontece, colocamos esta amizade em risco. Duvidamos dela. Dá-se o processo da desilusão. A pessoa não corresponde ao que esperávamos dela. À nossa expectativa dela, à visão que tinhamos dela.

Porque atraimos desilusões? Elas só acontecem quando algo em nós, uma crença, um conceito está elevado demais, quando existe uma expectativa demasiado elevada de algo ou alguém, quando estamos iludidos com algo ou alguém. Quando não os vemos com clareza, tal como eles realmente são. Nós atraimos as desilusões através de pessoas, situações, que nos vêm ajudar a desfazer o que está iludido em nós. É um processo doloroso mas que a um nível mais elevado, tem um objectivo positivo. O de nos fazer abrir os olhos, afastar as nuvens, as ideias enganosas que absorvemos com as nossas vivências.

Será que no caso acima, um amigo que não esteja sempre presente deixa de ser amigo? Certamente que não. Cada um de nós tem as suas vidas, os seus compromissos. Pode acontecer algo inesperado na vida deste amigo que o impossibilita de estar presente a certa altura, algum tipo de impedimento. Mas isto não o torna menos amigo.
É nestas alturas que precisamos redefinir os nossos conceitos, crenças, valores, de forma a dar liberdade aos outros e a nós próprios. A verdade é que algum impedimento também pode acontecer da nossa parte e nós não podermos estar presentes a certa altura.

Quando esperamos demasiado dos outros, também exigimos demasiado de nós próprios, inclusive, nos colocamos sob pressão para atingirmos esse ideal que criámos. Quando as nossas expectativas diminuem em relação ao outro, também deixamos de exigir tanto de nós próprios, dando-nos a ambos mais liberdade.

Por vezes, pode acontecer nós termos uma visão de uma pessoa, a qual não corresponde ao que ela é realmente. É como se a vissemos por entre nuvens. E estas nuvens são ideias, crenças que temos em relação a certas pessoas, de acordo com a sua aparência, personalidade, raça, etc. Isto é projectar no outro uma ideia pré-concebida que temos dele. E só com o tempo, com a convivência é que vamos conhecendo a pessoa, e as nuvens vão-se afastando, descobrindo a nossa visão, deixando-nos ver quem a pessoa realmente é. Percebemos que algo não se encaixa na nossa visão inicial. De alguma forma, a pessoa surge na nossa vida para desprogramar a nossa forma de pensar, as ideias que temos pré-concebidas, as crenças que temos em relação a um certo tipo de pessoas.

Sempre que houver ideias pré-concebidas, preconceitos, crenças desalinhadas com o coração, etc, nós atraimos pessoas, situações, para nos desprogramar em relação a isso. Trata-se assim de um processo de desprogramação. É o afastar das nuvens que nos tapavam a vista, nos cegavam. E este descobrir das nuvens pode acontecer de duas formas: pela negativa, pela desilusão, pois a primeira visão da pessoa ou situação era de encantamento, e com o afastar das nuvens dá-se o desencantamento; e pela positiva, pela admiração, a primeira visão da pessoa ou situação era de falta de interesse, e com o afastar das nuvens dá-se a surpresa. Em ambos os casos é um acordar.

Nas relações de vários tipos, familiares, amorosas, de amizade, etc, temos tendência para projectar no outro uma ideia pré-concebida, um ideal. Isto significa que dentro de nós temos um ideal do outro, de acordo com o seu papel, se é pai, mãe, amante, amigo, filho, professor etc. Se é pai, deve ser proceder assim, se for amante, deve proceder assado. E assim por diante. E quando a pessoa não corresponde ao nosso ideal, nós ficamos confusos, desiludidos. Algo não se encaixa. Inclusive, não conseguimos ver o amor na forma como essa pessoa nos dá. É preciso ver o outro tal como ele é, para além do seu papel. Um ser que pode ser complexo, com medos e inseguranças, que nem sempre age de acordo com o papel que esperamos, que idealizamos. E isto não quer dizer que o amor não esteja presente. Simplesmente nos é dado de forma diferente do esperado.

O afastar das nuvens que tapam a nossa visão é um caminho que nos faz voltar a nós próprios, à nossa verdadeira essência, que nos dá mais liberdade, alinha-nos com o coração. É um processo que, quando não é compreendido, pode-se passar por muito sofrimento.

O segredo para se ultrapassar isto é compreender o processo, perceber a ilusão que se tem e dissolvê-la. Só quando assumimos a responsabilidade sobre as nossas desilusões, e agradecemos interiormente ao outro por nos desiludir, nos desprogramar uma ilusão, ideia pré-concebida ou enganosa, crença, valor, etc, que temos, poderemos assumir o nosso poder pessoal e voltar a nós próprios. Ao nosso verdadeiro Eu.

E quando deixarmos de esperar, o inesperado acontece.

Sandra Duarte



Drifting Away the Clouds


One of our biggest challenges in life involves understanding disillusion. Why do we disillusion ourselves? What do we learn from this? How to go through this process without much suffering?

As we grow, we file in our memories, interpretations we make of reality, of events in our life, we create and absorb beliefs, ideas of the world around us. This is a security file, so we won’t repeat the same path when the experience wasn’t pleasant, and to repeat the experiences that made us feel good. In many of these files, we keep concepts, notions, beliefs about reality we acquired with our life experiences and with what we absorbed from others around us. Except that sometimes, some of these concepts, beliefs, collide with our true nature, limiting us. Preventing us from vibrating in our purest energy. They’re like clouds we absorb and cover us, hiding our true Self. They create illusions and prevent us from seeing clearly others and situations.

Suppose we acquire a belief that a good friend is the one who’s always present in our life, whatever the situation. When this doesn’t happen, we put this friendship in jeopardy. We doubt it. The process of disilluson takes place. The person doesn’t match to what we hoped of it. To our expectation of it, to the vision we had of it.

Why do we attract disillusions? They only happen when something in us, a belief, a concept, is to high, when there’s an expectation too high of something or someone, when we’re deluded with something or someone. When we don’t see them with clarity, as they really are. We attract disillusions through people, situations, that come to help us to undo what’s deluded in us. It’s a painful process but at a higher level, it has a positive purpose. Making us open our eyes, remove the clouds, the misleading ideas we absorb from life experiences.

Does in the case above, a friend who’s not always present stops being a friend? Certainly not. Each one of us has its own lives, its own commitments. Something unexpected can happen in this friend’s life that prevents him from being present at some point, some kind of hindrance. But this doesn’t make him less friend.
That’s when we need to redefine our concepts, beliefs, values, to give freedom to others and to ourselves. The truth is that some kind of hindrance may happen to us as well and we may not be able to be present at a certain point.

When we expect too much of others, we also expect too much of ourselves, even putting ourselves under pressure to achieve that ideal we created. When our expectations decrease regarding the other, we also stop demanding too much of ourselves, giving us both more freedom.

Sometimes, it can happen we have a vision of a person, which doesn’t match who it really is. It’s as if we saw it through clouds. And these clouds are ideas, beliefs we have regarding certain people, according to their appearance, personality, race, etc. This is projecting on the other a preconceived idea we have of it. And only over time, getting along with it is how we get to know the person, and the clouds will drift away, uncovering our vision, letting us see who the person really is. We realize that something doesn’t fit our initial vision. Somehow, the person comes into our life to deprogram our way of thinking, preconceived  ideas we have, beliefs we have regarding a certain kind of people.

Whenever there is preconceived ideas, prejudices, beliefs misaligned with the heart, etc, we attract people, situations, to deprogram us regarding that. This is therefore a process of deprogramming. It’s drifting away the clouds that covered our vision, blinded us. And this uncover of the clouds can happen in two ways: negatively, through disillusion, because the first vision of the person or situation was of enchantment, and when removing the clouds, disenchantment takes place; and positively, through admiration, the first vision of the person or situation was of lack of interest, and when removing the clouds, a surprise takes place. It’s an awake in both cases.

In relationships of several types, family, love affairs, friendships, etc, we have a tendency to project on the other a preconceived idea, an ideal. This means that within us we have an ideal of the other, according to its role, wether father, mother, lover, friend, son, teacher, etc. If it’s a father, he should be doing this, if it’s a lover, he or she should be doing that. And so on. And when the person doesn’t match our ideal, we get confused, disappointed. Something doesn’t fit. We can’t even see the love in the form that person gives us. We need to see the other as it is, beyond its role. A being that can be complex, with fears and insecurities, who doesn’t always act according to the role we expect, we idealize. And this doesn’t mean that love isn’t present. It’s simply given in a different way than expected.

Drifting away the clouds that cover our vision is a path that makes us return to ourselves, to our true essence, that gives us more freedom, aligns us with the heart. It’s a process that, when it’s not understood, we can go through a great suffering.

The secret to overcome this is to understand the process, realize the illusion one has and dissolve it. Only when we take responsibility for our disillusions, and be internally grateful to the other for disillusioning us, for deprogramming an illusion, preconceived  or misleading idea, belief, value, etc, we have, can we assume our personal power and return to ourselves. To our true Self.

And when we stop expecting, the unexpected happens.

Sandra Duarte


Sem comentários:

Enviar um comentário